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segunda-feira, 2 de junho de 2025

A Sabedoria Ancestral dos Povos Indígenas Aplicada aos Dias de Hoje


Você já ouviu falar da Meperita? Uma cola adesiva feita com própolis, usada pelos Mehinako — o "Super Bonder™ da floresta", totalmente biodegradável e eficaz. Ou do PÜKÜTIVE, uma estrutura usada por eles para transportar objetos pesados sobre a cabeça, aproveitando o equilíbrio do corpo com eficiência energética. E que tal o sabão vegetal dos Tupinambás ou a bebida fermentada Cauim, rica em significado e microbiota?

Estes exemplos não são curiosidades exóticas. São soluções engenhosas, desenvolvidas com base na observação atenta do meio ambiente e na convivência respeitosa com a natureza. Hoje, essas práticas podem inspirar alternativas mais saudáveis e sustentáveis para nosso cotidiano.

Vida em Harmonia com o Ambiente

A superioridade da vida tropical indígena não está nos confortos da tecnologia, mas na elegância da convivência com a natureza. As florestas, rios, plantas e animais não são apenas recursos: são parentes, divindades, fontes de aprendizado. Segundo Murgel (1930), a relação dos povos indígenas com a natureza é tão profunda que transforma rios em deuses e árvores em símbolos de sabedoria. Assim, o cuidado com o ambiente não é um dever — é parte da identidade.

Costumo chamar essa sabedoria aprendida oralmente, de geração em geração e reforçada por relatos históricos, de itagenemimética (o ato de imitar os mais velhos).

Os últimos avanços em bioengenharia, combinados com o conhecimento ancestral indígena, podem abrir perspectivas nunca antes inimaginadas ​​para a humanidade, como medicamentos para curar diferentes tipos de câncer, vitaminas capazes de aumentar a longevidade e muitas outras.

Em 1614, D’Abbdeville registrou que os indigenas reconheciam fenômenos naturais no horizonte que escapavam aos marinheiros mais experientes. Eles sabiam, só com o olhar, distinguir entre uma nuvem e uma terra distante. Isso não é apenas sensibilidade: é ciência de observação, transmitida oralmente, dia após dia, geração após geração  (saiba mais sobre astronomia indígena).

Saberes que revolucionaram (e podem continuar revolucionando)

Você sabia que o conhecimento indígena sobre plantas medicinais ajudou a desenvolver a anestesia moderna? Com domínio de mais de 200 mil espécies da flora, os indígenas testaram, categorizaram e ensinaram os usos terapêuticos das plantas muito antes da ciência ocidental reconhecê-los. Sem esse saber, boa parte da medicina atual simplesmente não existiria.

Além disso, hábitos tão naturais para muitos brasileiros — como dormir em redes, tomar banhos diários, consumir guaraná — vêm diretamente dos povos originários. Ainda hoje, há práticas que podemos (e devemos) redescobrir:

1- Guaraná – o estimulante 100% brasileiro


Os indigenas da etnia Sateré Mawé foram os primeiros a descobrirem e nos legar os benéficos efeitos do guaraná, uma as bebidas mais consumidas no Brasil na forma de refrigerantes.

 A Paullinia Cupana, é atualmente usada também como suplemento nutricional, haja vista as suas propriedades estimulantes, principalmente da guaranina, substancia estimulante cuja o efeito é de 4 a 7 vezes mais eficiente do que o da cafeína, alem das vitaminas A, B1, B3, E, PP, Cálcio, Ferro, etc. tem importante papel na regulação do peso, diurético, para tratamento de diabéticos o guaraná é um importante coadjuvante no controle de glicemia, melhora o desempenho intelectual e sexual.

O guaraná tem sua maior produção no estado da a Bahia, onde o cultivo além de ser feito em larga escala, possui grande notoriedade socioeconômica.

Preparo e consumo do guaraná pelos Saterés Mawés

Para fazer o bastão de çapó, a mulher Sateré Mawé inicia o processo colhendo os grãos de guaraná maduros das plantas. Em seguida, ela os descasca para obter as sementes, que são deixadas de molho em água por um período específico. Depois desse tempo, as sementes são secas em um forno.

Uma vez secas, as sementes são colocadas em um pilão e socadas até se transformarem em uma massa homogênea. Água é adicionada gradualmente à massa, formando uma mistura semelhante à massa de modelar, conhecida como "pão de çapó".

Com a massa pronta, ela molda o "pão de çapó" em bastões ou rolos, que são colocados para secar em um fumeiro. O fumeiro é uma tenda quente onde fogueiras são acesas para defumar o bastão de çapó. Esse processo de defumação dá ao bastão de çapó seu aroma característico e o prepara para ser ralado na língua de pirarucu durante o ritual de preparo do çapó.

O çapó, guaraná em bastão ralado na água, é a bebida cotidiana, ritual e religiosa, consumida por adultos e crianças em grandes quantidades. O preparo e o consumo do çapó seguem uma série de práticas que somadas resultam em uma sessão ritual, que são sempre as mesmas, seja quando o çapó é oferecido para a família, ou durante uma reunião de tuxauas.

Cabe à mulher do anfitrião, ou a uma de suas filhas, ralar o guaraná numa pedra que cabe na palma da mão, ou, mais recentemente, numa língua de pirarucu (Arapaima gigas). Esta operação é feita com a bola ou o bastão de guaraná molhados, em fricção com a superfície da pedra ou da língua de pirarucu, formando uma espécie de uma “lama” fina de guaraná que vai sendo dissolvida com água dentro de uma cuia (Crescentia cujete). A cuia quando não está no colo da fazedora do çapo, ou quando não está passando de mão em mão, permanece apoiada no patawi.

Quando a mulher que está preparando o çapó verifica que chegou a quantidade correta de guaraná ralado diluído na água, passa a cuia para seu marido, que primeiramente se serve de um pouco do çapó, para então passar para os presentes, entregando a cuia em primeiro lugar para os mais velhos, ou para visitantes ilustres. Daí em diante, a cuia passa de mão em mão, e quando esvaziada é entregue para o dono da casa, que por sua vez devolve à esposa que prepara uma nova rodada de çapó.


Caso algum participante da sessão de çapó não goste da bebida não irá recusá-la, bebendo apenas um pequeno gole e passando adiante. Outra formalidade importante é que a ultima pessoa da rodada de çapó não deve devolver a cuia vazia para o dono da casa, sempre deixando um pouquinho de çapó.


As sessões de çapó têm várias rodadas, ou seja, a mulher do dono da casa irá preparar várias cuias de çapó conforme a disposição dos visitantes e familiares de tomarem çapó e conversarem. Geralmente o dono da casa que encerra a sessão passando a cuia com o restinho de çapó para algum membro de sua família;

2- Meperita – a Super Bonder™ da floresta 


Recentemente cientistas da Unicamp e da Universidade de Rochester (EUA) obtiveram resultados promissores com o uso do própolis de abelha como agente antimicrobiano no combate à cárie e à doença periodontal. Um estudo recente mostrou que o uso de um enxaguatório oral com própolis do Rio Grande do Sul por indivíduos que se abstiveram de escovar os dentes durante 3 dias e ainda fizeram bochechos com uma solução de sacarose (o açúcar refinado comum) cinco vezes ao dia tiveram uma redução de 40% na formação da placa bacteriana, grande vilã no desenvolvimento das duas principais doenças da cavidade oral.

O mecanismo de ação parece estar associado à inibição da enzima glicosil-transferase, responsável pela transformação do açúcar que ingerimos em polissacarídeos insolúveis, que por sua vez formam uma espécie de cola biológica utilizada pelas bactérias para se fixarem à superfície dental. Protegidos e seguros nesse micro-habitat, os microorganismos metabolizam o açúcar e produzem ácidos e toxinas que desmineralizam o esmalte dentário e agridem os tecidos periodontais (gengiva, fibras de inserção do dente e osso). Alguns compostos presentes no própolis agiriam derrubando a casa das bactérias, por assim dizer, diferentemente do que ocorre com a ação de outros agentes químicos usados no combate à placa dental, como é o caso da Clorexidina, que age diretamente sobre a célula bacteriana.

Mas os indígenas já fazem uso da própolis para diversos fins a muito mais tempo, um dos exemplos mais impressionantes é a massa adesiva “Meperitchia” feita pelos Mehinakos a partir da própolis que funciona como um Durepox™.

3- Dormir em redes


Uma tese de doutorado feita pelo professor Ricardo Ramos da Universidade Estadual de Roraima (UERR) comprovou que os benefícios de se dormir em redes vão além da transmissão de sensação de conforto.

Natural da cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, o enfermeiro e doutor em Ciências, Ricardo Ramos, disse que a idéia surgiu por meio de uma observação empírica, já nos primeiros dias em que chegou ao Estado, a mais de dez anos atrás.

“A pesquisa foi feita pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro [Unirio], por meio do programa de doutorado de Enfermagem e Biociências, do qual eu fazia parte como aluno. Os testes foram todos feitos dentro do laboratório do curso de enfermagem da Universidade Estadual de Roraima [UERR]...”.

Segundo ele, foram realizados aproximadamente 100 testes no laboratório de enfermagem da UERR. Durante os testes, o especialista notou diferenças perceptíveis na temperatura corporal das cobaias. “40 pessoas foram utilizadas no estudo e elas realizaram teste tanto em redes quanto nos colchões, com tempo cronometrado em 30 minutos.

Os benefícios são múltiplos, principalmente para os convalescentes, tais como alivio do peso do corpo em muitos casos de danos à coluna, melhor resposta a febres e doenças ligadas a capacidade da pele de resfriar o corpo, alem do grande beneficio de reduzir o custo na ampliação de leitos hospitalares, “Nas unidades hospitalares, nós já temos a adoção das redes para os pacientes indígenas. Porque também não oferecer o mesmo para os não indígenas? Isso ajudaria de alguma forma a desafogar leitos, que é um dos principais problemas da atualidade. Temos também a questão dos pacientes acamados em casa, que também passam a contar com essa vantagem, já que o custo de uma cama está em torno de R$ 1.500, e um colchão hospitalar na faixa de R$ 600”complementa o médico.

O primeiro relato sobre as redes encontra-se na carta de Pero Vaz de Caminha sobre o descobrimento do Brasil, lá vemos os detalhes sobre a vida na floresta, endereçada ao o rei de Portugal, Dom Manuel Primeiro, em 1500.

"Havia 9 ou 10 casas as quais diziam que eram tão compridas, cada uma, como esta nau capitânia; e eram de madeira; tinham por dentro muitos esteios e de esteio a esteio uma rede, atada pelos cabos, em cada esteio e altas, nas quais dormiam", revela o documento.

"Ela significa ou representa também a certidão de nascimento da rede, já que ela registra o primeiro contato dos europeus, dos portugueses com os indigenas no Brasil", relata o historiador e antropólogo Márcio Couto Henrique, que ainda complementa "A rede serve não só pra embalar o corpo das pessoas, mas os sonhos, as fantasias e a vontade de viver".

4- Fumo, Ayahuasca e Paricá – ‘medicinas’ da floresta


Como já mencionei no texto introdutório, a cultura civilizada transformou o habito de fumar em um dos mais degenerativos da nossa sociedade atual, isso se deveu à um total desequilíbrio de consumo – os indigenas sabem muito bem que forças da natureza são remédios, que se usados na dosagem certa curam, mas em mal uso tornam-se em poderosos venenos.

Do ponto de vista espiritual, todas essas ‘medicinas’ indígenas vem sido usadas na sociedade atual como uma nova forma religiosa e filosófica de se integrar ao mundo natural, respeitar o planeta e entender as gigantescas forças de equilíbrio que nos movem.

Ainda em estudos, a ayahuasca vem sido usada na lida de dependentes de drogas ilícitas, usada em tratamentos não ortodoxos, em contexto religioso/filosófico, como auxiliar na redução do consumo abusivo de psicoativos. Foi utilizada em pesquisas de estudo de caso, no qual entrevistas abertas com uma usuários regulares de cocaína, nicotina e álcool que abandonaram este comportamento após entrar em contato com a ayahuasca. Apesar de ser considerado com tabu, pesquisa como essa abre as portas para resolver um dos mais graves problemas sociais que enfrentamos hoje no mundo.

Ayahuasca - A palavra ayahuasca tem sua origem na língua Quéchua, língua falada nos altiplanos andinos (Dobkin de Rios, 1972), e significa, dentre outras, "corda dos mortos", em referência às várias espécies de cipó utilizadas como base da preparação de um psicoativo utilizado por pelo menos 72 grupos indígenas diferentes, espalhados pelo Brasil, Colômbia, Peru, Venezuela, Bolívia e Equador.

Paricá - Existem basicamente dois utensílios utilizados no costume inalar o rapé (Paricá) - ó Tepí, utilizado pelo xamã para assoprar a medicina no membro da aldeia e o Kuripe, utilizado pelo próprio usuário. Pode ser utilizado por meio dos quatro elementos: 1-Fogo: é o tabaco queimado em cachimbos e apenas baforado, sem tragá-lo. Utilizado por meios de ritualizações e rezas. Considera-se que a fumaça lançada ao ar carrega a oração até o Grande Espírito; 2-Terra: é o tabaco seco mascado e cuspido; 3-Água: preparado pela sua infusão em água a dias e inalado via nasal ou oral(de acordo com o ritual); e o 4-Ar, usado no ritualístico do rapé (aspirado via nasal);

5- O Sabonete Tupi, Genipapo Verde, o Banho Diário, Ervas e a Garrafada – os remédios da Floresta


Muito antes da chegada dos europeus, os povos Tupis já conheciam o poder da natureza para cuidar do corpo e do ambiente. Um exemplo marcante é o uso da saponária, nome popular para o fruto do Sapindus saponaria, também conhecido como genipapo verde, sabão-de-soldado ou saboeiro.

Essa planta nativa das Américas era usada pelas comunidades indígenas como sabão natural — bastava esfregar os frutos em contato com a água para formar espuma e realizar a higiene pessoal ou até lavar utensílios. Era uma tecnologia viva, passada entre gerações, que mostrava o equilíbrio entre ciência e natureza.

O segredo está no seu princípio ativo natural: as saponinas. Essas substâncias têm ação detergente, antimicrobiana e antifúngica, capazes de limpar suavemente sem agredir a pele ou o meio ambiente. Hoje, esse conhecimento ganha nova relevância frente à busca por alternativas sustentáveis e menos químicas na indústria cosmética e de limpeza.

A saponária é mais do que uma planta: é símbolo da inteligência ecológica e bioquímica dos povos originários, que há séculos entendem o que a ciência só recentemente começa a validar.

O banho em águas termais e seus efeitos benéficos são antigos conhecidos da humanidade, mas foi o convívio com nossos indigenas que fez com que os colonizadores percebessem que a higiene era a melhor profilaxia contra milhares de enfermidades relacionadas a falta dela, tais como a cólera, leptospirose, amebíase, ascaridíase, etc,

No século 14 a malaria assolava o mundo, mas os jesuítas que estavam no Brasil pareciam ter a solução, eles faziam infusões com a casca de cinchona para combater os sintomas, o remédio dos indigenas funcionava perfeitamente. Mas foi só no século 18 que dois químicos franceses, Joseph Pelletier e Joseph Caventou, isolaram a quinina presente na cinchona e identificaram seu principio ativo como a cura da malaria. O feito talvez tenha sido o primeiro ato de itagenemimética, na qual um conhecimento indígena secular, se mostrou cientificamente como solução a um mal mundial. Alem disso,  proporcionou a popularização mundo do remédio indígena e, de quebra, a invenção da água tônica, refrigerante de quinino, derivado da quinina.

Clayton Coelho, pesquisador da Unifesp em uma recente pesquisa da Universidade da Paraíba analisou 23 especiarias usadas popularmente como remédios antimicrobianos com origem em conhecimentos indígenas. Depois de avaliar os efeitos, 40% das plantas tiveram suas propriedades comprovadas. Isso porque nenhum conhecimento surge do nada, sem qualquer embasamento.

Tal como o quinino e a aspirina, que fez uso da casca de arvores (o salgueiro no caso da aspirina, descoberta pelos indigenas americanos e também por Hipocrates, do outro lado do mundo), a toxina d-tubocurarina, extraída do curare, veneno que os indigenas colocam na ponta das flechas para imobilizar caças virou relaxante muscular, usado por anestesistas durante cirurgias, principalmente para controlar convulsões. Já o jaborandi, árvore típica das regiões Norte e Nordeste, oferece os colírios de pilocarpina, que os indigenasusam há séculos para estimular a produção de suor, que mais tarde se descobriu como um importante remédio usado na cura do glaucoma.

Já remédios químicos que tratam arritmia e insuficiência cardíaca devem sua vida a uma planta ornamental de flores em forma de sininhos, a dedaleira. O chá dessa planta era feito pelos indigenas nativos para um distúrbio na circulação do sangue que causa insuficiência do coração.

6- Sistema Agroflorestal – a fazenda inteligente

Um grupo de imigrantes japoneses chegou ao município de Tomé-Açu, no Pará, no fim da década de 1920 com proposta de plantar da pimenta-do-reino, Nos anos 70 com a queda dos preços e epidemias nos pimentais fez com que repensassem seu negocio. Baseado em antigo conhecimento indígena, eles passaram a cultivar a pimenta-do-reino no mesmo espaço do cacau, bem como com o cupuaçu, mamão, açaí, coco, maracujá, castanha-do-pará, borracha natural e paricá. A praga dos pimentais foi combatida por predadores locais, trazidas pelas outras plantas, em equilíbrio com a natureza.

De lá para cá, o sistema foi aperfeiçoado na base da tentativa e do erro para a escolha das melhores combinações de espécies. Hoje, Tomé-Açu é referência nesse tipo de plantio e a cooperativa acumula diversos prêmios relacionados a empreendedorismo e sustentabilidade. Além disso, a CAMTA promove e orienta a adoção dos sistemas agro-florestais para agricultura familiar em municípios vizinhos e realiza a comercialização dessa produção, um projeto que atende cerca de mil famílias da região.

Os Saterés Mawés tem suas mudas de guaraná plantadas em meio a floresta, com isso as plantas eram polinizadas e multiplicadas naturalmente, bem como tinham as suas pragas combatidas por agentes endógenos das matas. É também o caso do cacau e do cupuaçu, no qual muitas etnias indígenas perceberam que as pequenas abelhas uruçu-amarela (Melipona flavolineata) pareciam fazer multiplicar o numero de frutos dessas arvores. Mais tarde, pesquisadores do Embrapa descobriram que estas abelhas são as principais polinizadoras desses frutos.

O sistema agro-florestal, conhecido dos povos indígenas já a muito tempo, oferece uma série de vantagens como:
- Como gera grande quantidade de matéria orgânica no solo proveniente de diversas culturas, há menos necessidade de adubos e agrotóxicos;
- Essa variedade de nutrientes gera alimentos mais saudáveis;
- A cobertura vegetal abundante também retém a umidade da terra, protege as plantações do Sol e proporciona um ambiente mais agradável para o trabalho no campo;
- O plantio de diversas culturas ao mesmo tempo permite a produção continuada e gera renda durante o ano todo.

7 – O cauim - a bebida de catequese da floresta

“Nos últimos anos venho dedicando minhas atividades às funções de artista e cientista, principalmente no que se refere ao CAUIM, bebida alcoólica fermentada de mandioca, consumida por mais de 270 etnias indígenas brasileiras, que eu quero trazer para o grande publico na forma de uma bebida industrial, (com garrafa bonita e tudo) produzida com processos sofisticados, com grandes similaridades ao saquê. Essa iniciativa tem o grande propósito de fazer com que sintamos orgulho de sermos brasileiros de origem Tupi - sonho com o dia em que todos nós, brasileiros e/ou estrangeiros, poderemos comer os pratos sofisticados de Alex Atala ou Tiago Castanho harmonizado com Cauim dos Yekuanas ou dos Waurás, embalados na 'Tupi Pop Culture'.

A produção do Cauim dentre os Wajampis, chamado por eles de Caxiri, acontece conforme ritual antigo de tradição oral - a mandioca é ralada e mastigada pelas virgens Wajuins, o mosto então fervido e colocado em barcas de madeira, chamadas de Kasirirenas, recipientes que se caracterizam por serem rasos e largos, expondo grande área de superfície em contato com o ar, promovendo uma fermentação alcoólica promovida por leveduras endógenas que pode durar 20 dias.

A festa da cauinagem é a relação da bebida com a espiritualidade de nossos indigenas é muito similar com a relação que o saquê tem com a religião xintoísta no Japão, ambas as culturas compartilham de muitos elementos em comum, por isso adotei técnicas japonesas para produzir a bebida em sua forma industrial.

Trazer o Cauim para o consumidor brasileiro parece se a maior, a primeira, e a mais simbólica das atitudes de itagenemimética, tarefa a qual dedico toda a minha ciência, filosofia, historia e religião”. Luiz Pagano.

Numa situação imaginária vemos mestres Cauineiros de etnias optantes colocando mosto no tanque de fermentação, com a evolução social nas aldeias, o cauim comercial, diferentemente do cauim ritualístico, pode ser feito por homens. Infewlizmente essa é uma imagem aspiracional - quem sabe um dia veremos essa e outras censa como essa nas aldeias.

8- Spas Pihin – pintura corporal como forma de carinho e relaxamento



Em 2006 a top Gisele Bündchen passou dois dias na aldeia dos Kisêdjê, no Parque Indígena do Xingu - nordeste de Mato Grosso e entregou-se de corpo e alma aos costumes da etnia.

Após ser recebida pelo cacique Kuiussy Suyá e pelas integrantes da aldeia, Gisele foi transformada em uma nativa com a cuidadosa aplicação das pinturas corporais. Para a top mais majestosa do planeta, as índias fizeram grafismos tradicionais, destinados às mulheres que se destacam na comunidade por sua beleza. 
Inspirado nos saberes dos povos indígenas brasileiros, o Spas Pihin resgata uma tradição milenar onde o toque, a escuta e a pintura corporal se unem como forma profunda de carinho e cura. Mais do que uma estética, as pinturas com jenipapo e urucum desenham a alma sobre a pele, promovendo acolhimento, identidade e conexão com o sagrado. Nesse espaço de relaxamento, as pessoas não apenas recebem massagens que aliviam o estresse físico, mas são envolvidas por gestos de afeto e rituais que trazem equilíbrio emocional e espiritual. O corpo é tratado com respeito, o espírito é honrado, e o bem-estar emerge como consequência natural de uma troca verdadeira entre quem cuida e quem é cuidado. Em tempos de desconexão e correria, o Spas Pihin nos convida a parar, respirar e lembrar: o toque humano, guiado por sabedoria ancestral, ainda é uma das medicinas mais poderosas que existem.

Até então nunca tinha visto uma integração genuinamente brasileira tão prospera e a idéia de um Spa Pihin me pareceu, e ainda me parece o melhor investimento brasileiro em turismo. Em sua concepção original os Spas ‘Tupi Culture’ tem como atração principal a terapia do ‘Pihin’, também chamada de ‘terapia da pintura corporal’.

A técnica de Pihin busca trazer a civilização urbana o equilíbrio supremo através do conhecimento milenar da arte da pintura corporal indígena. Também conhecida como ‘a terapia completa’, a tecnica Pihin promove o melhoramento do indivíduo em todos seus aspectos; físico, estético, mental, espiritual e psicológico. http://ameobrasil.blogspot.com/2013/09/spa-pihin-ou-spa-nova-tupi-uma-nova.html

9 – Pegar onda na pororoca

A exemplo dos investimentos nos esportes de inverno, feitos pela Red Bull na Suíça e na Áustria, o Brasil também entra nesse cenário, com a pratica de esportes em meio às forças da natureza, patrocinados pela marca de energéticos Austríaca.

Em 2005 Serginho Laus conseguiu medir com precisão o que é surfar na pororoca do rio Araguari; Ele foi a 19,6km/h, por num percurso de 11,8km, que durou 36 minutos.

A ABRASPO - Associação Brasileira de Surf na Pororoca é a entidade que desde 1999 anos promove e divulga o surf na pororoca. isso também é uma forma de incentivar o turismo e o intercambio cultural entre o publico jovem.

10 – Estética, Design e arte

A partir desse décimo ponto, coloco algumas conjecturas e sonhos, mesclados e baseados em atuais realidades –

Oskar Metsavaht da Osklen, lancou no SPFW de2015 lanço uma linha completa de roupas com motivos baseados na cultura Ashaninka, foi grande sucesso no Brasil e no mundo.

O uso de piercings e botoques feitos de plexiglas podem vir a ser as principais manifestações culturais para adolescentes e simpatizantes da Tupi Pop Culture, muita arte ainda pode e será criada a partir de elementos Inspirados em artefatos indígenas. Inspirada nos Frank Gehry's Fish Lamps, vemos este ‘Abajur Pirarucu’;

11- Ocas tecnológicas e cidades sustentáveis

Talvez a melhor contribuição dos indigenas seja o fato de eles terem casas sustentáveis e biodegradáveis e aldeias despoluidoras em completa harmonia com a natureza – nesse campo os arquitetos e cientistas de vida urbana deveriam concentrar seus maiores esforços.

Nessa oca tecnológica, tal como a casa grande das aldeias os jovens se reúnem em um espaço de convivência escolar, inaugurando uma nova forma de pedagogia.

Casas com sistemas de compostágem e tratamento de água individuais,  poderiam ser construídas sem nenhum impacto as margens de rios repletos de vida.

Aqui vemos um prédio inteiramente construído de fibras vegetais e novidades de bio & nano tecnologia aprendida a partir do conhecimento indígena, no qual cada residente sente o balanço do vento em relaxante atmosfera de convivo a natureza.


Seguramente a Itagenemimética pode nos dar infinitas soluções para os problemas atuais, desafio o leitor a colocar nos comentários todas as aprendizagens que conhece, de nossos indigenas brasileiros ou de outras origens, para fazermos com que essa lista chegue em centenas de itens.



12- Pião de Tucumã

Aqui vemos o sábio Sykyã fazendo o pião de tucumã para seus netos

 Quanto a origem do pião, muitas teorias são atribuídas, no entanto sabe-se que o relato mais antigo vindo das notações feitas na expedição de Meriwether Lewis e William Clark pela America do Norte em 1804, descreve crianças de diversas etnias brincando com piões. parecia ser a nova coqueluche pelas aldeias da época.

O brinquedo tem sua existência relatada na tradição desde o inicio dos tempos por diversas etnias,  na América do norte e do sul. Quando os Panará foram transferidos de suas terras para dentro do Parque do Xingu, pelos irmãos Villas Boas, devido a construção da estrada BR 163, eles foram morar em uma aldeia junto com os indigenas Suyá. 

O pião pode ser feito com a semente do tucumã, uma fruta de uma palmeira típica da região amazônica ou com uma pequena cabaça.

Muito além do folclore

A diversidade cultural indígena do Brasil é comparável à da Europa: 222 etnias contra 234 no continente europeu. Mas ao contrário do que se pensa, esse universo não é estático, nem romântico — é altamente funcional e ainda inexplorado em seu potencial transformador para os desafios modernos, como mudanças climáticas, segurança alimentar e saúde preventiva.

Ao estudarmos, respeitarmos e aplicarmos esses saberes ao nosso cotidiano, não apenas homenageamos os povos originários, mas abrimos portas para soluções que respeitam o planeta e transformam nossa forma de viver.

Então, que tal começar por algo simples? Usar menos plástico, tomar um banho com consciência, dormir numa rede, repensar o que colocamos no prato ou buscar alternativas naturais de cura. A floresta tem muito a ensinar — basta ouvir.


REFERÊNCIAS

BRANCO, Samuel Murgel. O desafio amazônico. 2ª edição. Editora Moderna. São Paulo: Brasil, 1930.
FILHO, Alexandre Toccoli; /OLIVEIRA, Matheus Carvalho de; /RIBEIRO, Rafael Bicudo; /SANTOS, Rodrigo Silva
Malaquias dos. Cosmologia indígena brasileira: Tupinambás e Guaranis. Disponível em:
http://disciplinas.stoa.usp.br/pluginfile.php/246176/mod_resource/content/1/Cosmologia%20ind%C3%ADgena%20
brasileira%20-%20Tupinamb%C3%A1s%20e%20Guaranis.pdf. Acesso em: 2 Abr.2016.
LEVI-STRAUSS, Claude. O cru e o cozido. Editora Cosac & Naify. São Paulo: Brasiliense, 1991.
ROSENFIELD, Rogério. A cosmologia. Disponível em:
http://www.sbfisica.org.br/fne/Vol6/Num1/cosmologia.pdf. Acesso em: 5 Mai.2016
MARQUES, C. T dos S; / GAMA, E. V. S; / CARVALHO, A. J. A; / SILVA, F; / FRIAS., M. T. RODRIGUES,
L. Relato sobre a Influência da Lua na Agricultura. Vitória: 1998.
D’ABBEVILE, Claude. História da missão dos padres capuchinhos na ilha do maranhão e suas
circumvisinhanças. Paris, 1614.
AFONSO, G. B. As constelações indígenas brasileiras. Observatórios Virtuais, USP, 2004.
AFONSO, G. B. Mitos e Estações no céu Tupi-Guarani. Scientific American Brasil, 2006. Disponível
em: http://www2.uol.com.br/sciam/reportagens/mitos_e_estacees_no_ceu_tupi-guarani.html
LUCIANO, Gersen dos Santos. O índio brasileiro: o que você precisa saber sobre os povos
indígenas no Brasil de hoje. Coleção educação para todos. Brasília: MEC/Secad; LACED/Museu
Nacional.
FABIAN, Stephen M. Space-Time of the Bororó of Brazil. Gainesville: University Press of Florida, 1992.

quinta-feira, 8 de maio de 2025

Exposição Indígenas em Toy Art no Parque das Tribos em Manaus


É com muita alegria que anunciamos a exposição Etnias em Toy Art na Escola Municipal Santa Rosa II, dentro do Parque das Tribos em Manaus, com base nos toys desse blog, no ultimo dia 07 de maio de 2025. 

É sabido que a arte só encontra seu verdadeiro propósito quando cumpre uma função social, e ver meus bonequinhos sendo usados por professores para inspirar pertencimento e orgulho em crianças indígenas é mais do que gratificante — é o significado da arte se concretizando.

Escola Municipal Santa Rosa II

"Já havia experimentado esse tipo de sentimento antes, com o movimento que criei chamado Capivara Parade, realizado em Curitiba, inspirada na CowParade do artista suíço Pascal Knapp, na qual a presença das capivaras nos centros urbanos do Brasil serve como um lembrete de que as cidades podem e devem ter atitudes sustentáveis em relação à natureza" disse Pagano.

 Etnias em Toy Art na Escola Municipal Santa Rosa II, dentro do Parque das Tribos em Manaus

O projeto Identidade Indígena na Escola — Arte, Cultura e Pertencimento fez mostrar as etnias presentes e representadas na Escola Municipal Santa Rosa II – Cultura e Diversidade”, idealizado pelo professor Francisco Fernando Bessa Bittencourt, foi aprovado no edital nº 004/2025 da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM) . A iniciativa é desenvolvida na Escola Municipal Santa Rosa II, localizada na comunidade Parque das Tribos, no bairro Tarumã, zona oeste de Manaus. 

Cartaz do Dia D da Interculturalidade Indígena nas Escolas Municipais de Manaus

Embora não esteja situada dentro de uma reserva indígena formalmente reconhecida, o Parque das Tribos é considerado a maior comunidade indígena urbana de Manaus, abrigando moradores de diversas etnias indígenas. 

Etnias que compõe o Parque das Tribos:






                   
 






1.Tikuna, 2. Wanano, 3. Kokama, 4. Witoto, 5. Bare 6. Baniwa, 7. Tukano, 8. Tariano, 9.Kuripaco, 10.Kubeo, 11.Miriti-Tapuia, 12. Jurupari-Tapuia, 13. Mura, 14. Satere, 15. Karapãna, 16. Apurinã, 17. Arapasso, 18. Miranha, 19. Hiskariana, 20. Piratapuia, 21. Tuiuka, 22. Munduruko, 23. Kulina, 24.Kanela, 25. Barrasana, 26. Kanamari, 27.Tupinanba-Jaquari, 28. Marubo, 29.Makuxi, 30.Rupita, 31. Nadeb, 32. Katukina, 33. Kambeba, .34. Wapixana.



Secretaria Municipal de Educação (SEMED-AM) é o órgão responsável por coordenar, executar e avaliar as políticas da educação pública Municipal da Cidade de Manaus, garantindo o acesso e a permanência dos estudantes nas escolas do Município de Manaus, AM.

Caixas colecionáveis ​​de "Indígenas na Toy Art". Infelizmente, não tivemos o suficiente para enviar para a escola Santa Rosa II este ano. Quem sabe no ano que vem teremos algumas.


Como parte das atividades do projeto, no dia 7 de maio de 2025, foi realizada uma cerimônia de autodeclaração étnica, promovendo o reconhecimento e valorização das identidades indígenas presentes na comunidade escolar. 

Toy Art Yanomami
Durante o evento, foi apresentada a exposição de nome “Etnias em Toy Art do artista Luiz Pagano”, que representa mais de 240 etnias indígenas brasileiras por meio de figuras estilizadas. A mostra serviu como ferramenta pedagógica para estimular o sentimento de pertencimento e orgulho entre os alunos.


Esse projeto exemplifica como a arte pode cumprir seu papel social, promovendo a valorização da diversidade cultural e fortalecendo a identidade indígena no ambiente escolar.

quarta-feira, 15 de maio de 2024

O Parque Nacional do Xingu - O PIX

 

O Parque Indígena do Xingu, anteriormente Parque Nacional Indígena do Xingu, é uma terra indígena brasileira, considerada a maior e uma das mais famosas reservas do gênero no mundo. Criado em 1961 pelo então presidente brasileiro Jânio Quadros, foi a primeira terra indígena homologada pelo governo federal. Seus principais idealizadores foram os irmãos Villas Bôas, mas quem redigiu o projeto foi o antropólogo e então funcionário do Serviço de Proteção ao Índio, Darcy Ribeiro.

Com uma área de 2.642.003 hectares, o Parque está situado no norte do estado de Mato Grosso, numa zona de transição entre os biomas de cerrado e amazônico. A região, toda ela plana, é caracterizada pela predominância de matas altas entremeadas de cerrados e campos, sendo cortada pelos formadores do Rio Xingu e por seus primeiros afluentes da direita e da esquerda. Os cursos formadores são os rios Kuluene, Tanguro, Kurisevo e Ronuro - o Kuluene assume o nome de Xingu a partir da desembocadura do Ronuro, no local conhecido pelos indígenas como Mÿrená (Morená). Os afluentes são os rios Suiá Miçu, Maritsauá Miçu, Auaiá Miçu, Uaiá Miçu e o Jarina, próximo da cachoeira de Von Martius.

O Parque Indígena do Xingu é considerado a maior e uma das mais famosas reservas do gênero no mundo. Criado em 1961, durante o governo de Jânio Quadros, foi resultado de vários anos de trabalho e luta política, envolvendo os irmãos Villas-Bôas, ao lado de personalidades como o Marechal Rondon, Darcy Ribeiro, Noel Nutels, Café Filho e muitos outros

Historia

A história do Parque Nacional do Alto Xingu remonta à à pré-história da região até a chegada dos europeus e além. Entre os anos 800 e 1400, os ancestrais dos atuais Aruak xinguanos estabeleceram-se na área, evidenciados por cerâmicas características e aldeias circulares. Durante os séculos seguintes, surgiram grandes aldeias fortificadas, indicando uma população densa e organizada. No entanto, a presença europeia trouxe mudanças, incluindo incursões bandeirantes e confrontos, até a primeira visita documentada de Karl von den Steinen em 1884. Esse período também testemunhou a chegada de outros grupos étnicos, como os Tupi Kamayurá e Aweti, consolidando a diversidade étnica no Alto Xingu.

Após as expedições iniciais de Karl von den Steinen, a região do Alto Xingu passou por uma série de transformações com a chegada de outros pesquisadores e exploradores, que trouxeram consigo não apenas conhecimento, mas também influências e impactos significativos para os povos indígenas da região. No entanto, foi a partir da década de 1940 que a presença dos irmãos Villas Bôas marcou uma nova era na história do Parque Indígena do Xingu.

A Fundação Brasil Central (FBC), liderada pelos irmãos Villas Bôas, desempenhou um papel fundamental na proteção e promoção dos interesses dos povos do Xingu. Em contraste com outras regiões do Brasil, onde a presença indígena muitas vezes era vista como um obstáculo ao progresso, os Villas Bôas reconheceram a importância de preservar a cultura e os modos de vida dos habitantes do Parque.

Orlando Villas Bôas, em particular, assumiu a direção da FBC e implementou uma série de políticas destinadas a garantir a integridade e autonomia das comunidades indígenas. Uma das iniciativas mais importantes foi o estabelecimento de um programa de assistência médica em parceria com a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), que continua até os dias atuais. Esse programa não apenas proporcionou cuidados de saúde essenciais, mas também ajudou a fortalecer os laços de confiança entre os índios e os agentes da FBC.

Além disso, os Villas Bôas lideraram esforços para demarcar as terras indígenas e proteger o Parque contra as ameaças externas, como a exploração madeireira, a mineração e a expansão agrícola. Suas ações foram guiadas por uma visão de que os povos do Xingu representavam "índios de cultura pura" e que seu modo de vida deveria ser preservado a todo custo.

No entanto, a abordagem paternalista dos Villas Bôas também gerou controvérsias, especialmente em relação à transferência de alguns povos para o Parque, como os Kaiabi, Ikpeng, Tapayuna e Panará. Embora essas ações tenham sido tomadas com a intenção de proteger as comunidades indígenas, alguns críticos argumentaram que elas limitaram a autonomia e liberdade dos próprios índios.

Apesar das críticas, a gestão da FBC sob os Villas Bôas conseguiu criar um ambiente relativamente isolado para os povos do Xingu, protegendo-os das influências externas que poderiam comprometer sua cultura e modos de vida tradicionais. Ao mesmo tempo, promoveu uma nova postura de respeito e valorização das comunidades indígenas por parte da sociedade nacional e internacional.

As Etnias que Vivem no Xingu

Entre os anos 1400 e 1600, surgiram grandes aldeias fortificadas, indicando uma densa população e influências de outras culturas. A presença europeia e as incursões bandeirantes a partir de 1750 marcaram um período de desafios e mudanças para as comunidades indígenas.

Grupos Maiores

EtniaPopulaçãoGrupo LinguísticoObs
Aweti195Tupi-Gaurani
Ikpeng459Karibconhecidos como Txikão
Kalapalo855Karib
Kamaiurá467Tupi-Gaurani
Kawaieté (Kaiabi)1193Tupi-Gaurani
Kisedjê (Suya) 330
Kuikuro653Karib
Yudjá (Juruna)348Juruna
Mehinako254Arauak
Yawalapití156Arauak
Waurá409Arauak
Grupos Menores e Kayapó

Matipu149Karib
Nafukuá126Karib
Trumai97Trumai
Tapayuna60Tapayuna
Naruvôtu69Karib
Kayapó 6365Kayapô*não faz parte do parque do Xingu
Ao longo dos anos, as etnias do Xingu mantiveram suas tradições, enfrentaram desafios e adaptaram-se às mudanças, preservando sua identidade e contribuindo para a diversidade cultural do Brasil.

Vamos dar uma olhada mais detalhada nas 16 etnias que habitam o Parque Indígena do Xingu e seu contexto:


1- Kayapó, Começando pelo norte do Parque, a etnia que melhor representa o parque, más que ironicamente não está dentro das limitações do mesmo, principalmente por sua mais forte liderança, é a dos Kayapo, cuja o principal representante Metyktire é o cacique Raoni.

Mesmo que a Terra Indígena Kayapó não faça parte do Parque Indígena do Xingu, sua localização na fronteira norte do parque, no estado do Pará, tem grande importância para a reserva indígena. A Terra Indígena Kayapó abrange uma área significativa onde vivem diversas comunidades da etnia Kayapó, incluindo as divisões Metyktire, Kremoro e outras.

Embora não faça parte do Parque Indígena do Xingu, a Terra Indígena Kayapó compartilha muitas semelhanças culturais e históricas com as comunidades que habitam o Xingu. Ambas as regiões são importantes para a preservação da cultura indígena e para a conservação da biodiversidade amazônica.

Falantes do idioma pertencente ao grupo linguístico Jê, os Kayapó estavam divididos em três grandes grupos, os Irã'ãmranh-re ("os que passeiam nas planícies"), os Goroti Kumrenhtx ("os homens do verdadeiro grande grupo") e os Porekry ("os homens dos pequenos bambus"). Destes, descendem os sete subgrupos kayapó atuais: Gorotire, Kuben-Krân-Krên, Kôkraimôrô, Kararaô, Mekrãgnoti, Metyktire e Xikrin, que habitam o norte do Parque Indígena do Xingu:

Metyktire: Esta divisão dos Kayapó é uma das mais conhecidas e estudadas. Localizada no norte do Parque Indígena do Xingu, Metyktire é uma das aldeias mais importantes e influentes da região. Os Metyktire mantêm uma forte identidade cultural e são conhecidos por sua habilidade em artesanato, como a produção de cestaria e objetos de madeira entalhada. Sua liderança tem desempenhado um papel significativo na defesa dos direitos indígenas e na preservação ambiental.

Kremoro: Outra divisão dos Kayapó que habita o norte do Xingu é Kremoro. Embora talvez não seja tão proeminente quanto Metyktire, Kremoro ainda desempenha um papel importante na comunidade Kayapó. Eles compartilham muitas das tradições e práticas culturais dos Metyktire, mas também têm suas próprias nuances e identidade única dentro do grupo Kayapó.

Xikrin: Os Xikrin, também conhecidos como Kayapó do Cateté, são uma divisão dos Kayapó que habita a região nordeste do Parque Indígena do Xingu, na Terra Indígena Trincheira Bacajá. Eles têm uma história rica e uma cultura vibrante, conhecida por sua cerâmica tradicional e suas habilidades na produção de artesanato. Os Xikrin também são ativos na defesa de seus direitos territoriais e na luta pela preservação ambiental.

Cada uma dessas divisões dos Kayapó contribui para a diversidade cultural e étnica do Parque Indígena do Xingu, desempenhando papéis únicos na comunidade e na preservação da identidade cultural e dos direitos indígenas.
 

2-Kalapalo: Os Kalapalo também viram flutuações em sua população ao longo dos anos. Originários da região, eles mantiveram uma presença significativa no Xingu, enfrentando desafios como epidemias e conflitos, mas também contribuindo para a diversidade cultural da área.


3-Kamaiurá: Com uma história que remonta ao século XIX, em 1946 passam a ter contatos regulares com os membros da expedição Roncador-Xingu, liderada pelos irmãos Villas-Bôas. Finalmente, em 1961, o território que habitam converte-se e Parque Nacional, hoje subordinado à Funai (Fundação Nacional do Índio).

A Casa Antropomorfa Kamayurá

Uma estrutura bem conhecida no Parque do Xingu é a casa antropomorfa Kamayurá é mais do que apenas uma estrutura física; é um símbolo vivo da cultura e tradição profundamente enraizadas dos Kamayurás e Yawalapitis. Sua construção não apenas proporciona abrigo, mas também fortalece os laços comunitários e transmite conhecimento ancestral de geração em geração.


Enquanto os homens trabalham na construção física da oca, as mulheres desempenham um papel igualmente importante na preparação dos alimentos e no apoio logístico. Essa divisão de trabalho não apenas demonstra a complementaridade de papéis de gênero na sociedade Kamayurá, mas também destaca a interdependência e cooperação entre os membros da comunidade.

Além de ser um local de convívio e celebração, a Casa Antropomorfa Kamayurá serve como palco para rituais, cantos e danças sagradas que conectam os Kamayurás com seus ancestrais e o cosmos. Sob o céu estrelado, esses povos compartilham histórias, ensinamentos e memórias.


4-Kuikuro: Com sua população sofrendo altos e baixos ao longo dos anos. Os Kuikuro habitavam, em 2004, três aldeias. A aldeia principal e maior era Ipatse, pouco distante da margem esquerda do médio Culuene, onde viviam mais de 300 pessoas. Em 1997, surgiu a aldeia de Ahukugi, na margem direita do Culuene, rio acima de Ipatse, com cerca de 100 pessoas. Em seguida, formou-se uma terceira aldeia no local da antiga Lahatuá, com um grupo familiar de uma dezena de pessoas.Sua presença na região contribui para a diversidade cultural e para a compreensão da história e dos desafios enfrentados pelas comunidades indígenas.


5-Matipu: Originários da região, os Matipu são conhecidos no parque pelos gritos matinais dos homens, uma característica marcante de sua cultura O contato com a sociedade não indígena e esforços de preservação cultural estão intimamente ligados à sua história e a do Parque Indígena do Xingu.


6-Mehinako: Até onde se tem conhecimento, os Mehinako sempre viveram na bacia do Xingu, na região dos rios Tuatuari e Kurisevo. A primeira aldeia de que se tem registro é Yulutakitsi, que deve ter sido habitada há 150 anos ou mais em localidade incerta, enfrentando desafios semelhantes aos de outras etnias da região. Sua história e cultura são uma parte importante do tecido cultural do Parque.


7-Nahukwá: Com uma história que remonta ao século XIX, os Nahukuá compõem o mais diminuto dos grupos que integram a área cultural conhecida como Alto Xingu, sua presença no Xingu contribui para a diversidade cultural e para a compreensão da história da região. Quando Karl von den Steinen esteve nessa área, em 1884 e 1887, os Nahukuá-Kalapalo-Kuikuro, então reconhecidos como um único povo, eram um dos grupos mais numerosos e estavam distribuídos em nove aldeias. Paul Ehrenreich, que acompanhou Von den Steinen em sua segunda expedição, afirma que uma aldeia nahukuá localizava-se no rio Kurisevo e que, nessa mesma época, seis ou oito aldeias mais se distribuíam ao longo do rio Kuluene.


8-Trumai: Os Trumai são considerados o último grupo a ter chegado na área dos formadores do Rio Xingu, tendo atingido a região na primeira metade do século XIX. A língua Trumai é considerada isolada, isto é, não apresenta parentesco genético com nenhuma outra língua do Xingu, nem com outras famílias lingüísticas brasileiras. A situação atual do Trumai é um pouco sensível, pois não há muitos falantes. A maioria das crianças já fala o Português como primeira língua; algumas delas também dominam outras línguas xinguanas, como o Kamayurá, o Aweti ou o Suyá.


9-Waurá ou Wauja: Os Waurá são notórios pela singularidade de sua cerâmica, o grafismo de seus cestos, sua arte plumária e máscaras rituais. Além da riqueza de sua cultura material, esse povo possui uma complexa e fascinante mito-cosmologia, na qual os vínculos entre os animais, as coisas, os humanos e os seres extra-humanos permeiam sua concepção de mundo e são cruciais nas práticas de xamanismo.

Desde os tempos primordiais, quando a escuridão envolvia o mundo, os Waurás acreditavam na existência de seres antropomorfos ou zooantropomorfos, conhecidos como yerupoho, que habitavam a superfície da terra juntamente com os humanos. Esses seres eram dotados de uma ambiguidade que os tornava simultaneamente gente e animal, artefato ou fenômeno natural.

A chegada iminente do sol representava uma ameaça para os yerupoho, que se lançaram em frenética atividade para se proteger, criando indumentárias e máscaras para se transformarem em apapaatai, seres sobrenaturais invisíveis e visíveis. Aqueles que conseguiram vestir suas indumentárias a tempo tornaram-se apapaatai visíveis, enquanto os que ficaram "nus" foram transformados em apapaatai iyajo, seres perigosos que representavam uma ameaça para os humanos.


A ontologia (área da filosofia que estuda a natureza do ser, da existência e da realidade) dos Waurás abrange três macrocategorias de seres: os iyãu (seres humanos), os mona (animais, plantas e artefatos) e os kumã (monstros). Os kumã são dotados de uma natureza extraordinária e podem ser tanto apapaatai quanto yerupoho. A relação entre esses seres é complexa e baseia-se na noção de "roupa" (nai), que permite aos yerupoho se transformarem em apapaatai através de uma variedade de formas animais, vegetais ou minerais.

Essa relação tríadica entre yerupoho, apapaatai e os seres do mundo natural constitui a base da cosmografia waurá, onde cada ser é percebido como co-extensivo, compartilhando uma mesma alma (paapitsi). Essa co-extensão implica que os perigos dos seres sobrenaturais também estão presentes na dimensão visível dos seres do mundo natural, criando uma fronteira tênue entre o ordinário e o extraordinário, o visível e o invisível.


10-Yawalapiti: Yawalapiti significa "aldeia dos tucuns", a localização mais antiga de que se recordam e está situada entre o Posto Diauarum e o travessão Morená (sítio próximo à confluência dos rios Kuluene e Batovi). 

Os Yawalapiti são reconhecidos pelos seu incríveis instrumentos musicais, associados a rituais e festas, dentre estas incluem a flauta Uruá, tocada somente por homens, sendo-lhe atribuído o poder de afastar os maus espíritos antes do Kuarup, com cerca de dois metros, feita de bambu, composta por dois tubos sem furos atados de tamanhos diferentes, soprados de forma alternada.


Além dos instrumentos de sopro, os Yawalapiti também utilizam uma variedade de instrumentos de percussão, que dentro do parque tem vários nomes, dependendo da etnia que os usa. É o caso do uay (ou oapy ou uapi), um tambor típico e os classícos mbarakás nome tupi para as marácas, que ganham outras versões em idiomas diferentes, como o mutomburé, o cutõe e o cotecá. E por fim os isntrumentos de percussão, como o Ngo-Kon, a maraca ou chocalho dos Kayapo-Xikrin.

Ritual do Pomeri, home com o rosto coberto por resina e penas de aves

11-Ikpeng: Vieram para a região do Xingu ainda no século XX, quando guerreavam com os habitantes locais. O contato com o homem branco se deu no início da década de 60, e teve conseqüências desastrosas para sua população, que foi reduzida em menos da metade em razão de doenças e assassintos.

O ritual do Pomeri é a principal festa de iniciação masculina, uma festa marcada pela tatuagem dos rostos dos meninos, e seu significado e práticas ritualísticas são fundamentais para a cultura e a cosmologia desse povo.

Durante o ritual do Pomeri, os meninos Ikpeng têm seus rostos tatuados como parte do processo de iniciação na vida adulta. O ritual começa com várias sessões de dança e é seguido por uma grande caçada, na qual os pais das crianças participam como donos da festa. Após aproximadamente um mês, um mensageiro retorna à aldeia anunciando o retorno dos caçadores. No dia seguinte, durante uma sessão de danças ao som de flautas e canto do cacique, os caçadores retornam com uma grande quantidade de caça, especialmente macacos.

Durante o ritual, os participantes revestem seus corpos com resina de madeira e penas de aves, realizam danças e consomem alimentos como mingau de perereba doce. Na última manhã da festa, as crianças são tatuadas. Incisões são feitas nos rostos das crianças com espinhos de tucum, e carvão é aplicado nas incisões, resultando na tatuagem.

Além do ritual do Pomeri, os Ikpeng também adotaram outras festas e práticas rituais do Alto Xingu, como o Tawarawanã e o Yamurikumã. Esses rituais são importantes para a identidade cultural e espiritual dos Ikpeng, refletindo suas crenças, valores e modo de vida.

A confusão entre humano e animal durante o ritual, como representado pelas máscaras de polpa de bambu que os dançadores usam para cegar a si mesmos, é uma característica importante da cosmologia Ikpeng. Isso reflete sua concepção complexa de identidade e sua compreensão da relação entre humanos e o mundo natural ao seu redor.



12-Kaiabi (ou Kawaieté) - A origem do nome Kaiabi perde-se no tempo e hoje os próprios índios não sabem dizer de onde surgiu e qual seu significado. É provável que seja a forma pela qual os Apiaká ou os Bakairi, que representam as primeiras fontes de informação sobre os Kaiabi no século XIX, a eles se referiam. Certamente não se trata de auto-denominação do grupo. Georg Grünberg, um etnógrafo que pesquisou os Kaiabi nos anos 60, sugere que a auto-denominação seja o termo iputunuun, que significa algo como "o nosso pessoal".

Ficaram conhecidos pelo incidente em 1983, no qual para reivindicar melhor atendimento da Funai eles interceptaram um avião no Posto Diauarum, localizado no Baixo Xingu, os Kawaieté têm uma história longa na região, enfrentando desafios como a pressão de frentes de expansão econômica ao longo dos anos. Sua presença no Xingu contribui para a diversidade cultural e para a compreensão da história do Parque.


13-Yudjá: Os Yudjá têm uma história marcada por sua habilidade como canoeiros, ameaçada por projetos de implantação de complexos hidrelétricos na região, preservam seu idioma natural, pertencente ao tronco Tupi-Guarani e nem todos os homens com mais de 50 anos dominam o português e talvez apenas a metade das mulheres adultas tenha dele uma compreensão razoável.

O nome Juruna ou Yudjá sediferem dos dois outros nomes par os humanos,  os Abi “Índios”, em idioma juruna incluem todos os povos indígenas que nem são falantes do juruna, e os Karaí, homens brancos.

Membro da etnia Kisêdjê vestido para celebrar a festa do rato - Amtô

14-Suyá: Os Suyá ou Kisêdjê são os únicos representantes do grupo linguistico Jê no PIX, desde sua chegada na região, provavelmente na segunda metade do século XIX, seu contato com outros povos xinguanos e, principalmente, com aqueles da chamada área cultural do Alto Xingu, ocasionou a incorporação de muitos costumes e tecnologias alheias. 

Más nunca abriram mão da sua singularidade cultural, cujo principal emblema pode ser reconhecido num estilo particular de canto ritual, expressão máxima das individualidades e do modo de ser da sociedade Kisêdjê. Até algumas décadas atrás, outro marco diferencial do grupo eram os grandes discos labiais e auriculares que, mais do que ornamentos, apontavam a importância do cantar e do ouvir para esse povo.


15-Aweti: Também conhecidos conhecidos como “Auetö”, tradicionalmente, exercem um importante papel entre os povos alto-xinguanos como intermediários na circulação de notícias ou bens e como anfitriões para os viajantes, mas a perda populacional catastrófica sofrida nas primeiras décadas do século XX, que quase resultou no seu desaparecimento como grupo, fez com que sua presença na área se tornasse menos visível. 

Certamente, os Aweti constituem o povo menos conhecido do Alto Xingu, e o mesmo vale para sua língua, com a recuperação populacional, no entanto, os Aweti retomam muito da vida cultural tradicional e têm procurado marcar presença na atual sociedade alto-xinguana.