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quinta-feira, 2 de julho de 2020

Tupinambá Antigo

Toy Art Tupinambá antigo
#NomesOutros nomes ou grafiasFamília linguísticaInformações demográficas
35ATupinambá

UF / País

RJ, SP, BA



Os Tupi-Guarani tornaram-se conhecidos historicamente por terem sido os primeiros a fazer contato com os europeus, no que seria o início do período colonial, e também pelo imenso território ocupado por esses grupos então: no litoral Atlântico desde o cabo de São Roque, ao norte, até o Trópico de Capricórnio, ao sul, assim como extensas áreas do planalto meridional e entorno.
Tupinambá - Aquarela sobre pergaminho mostra índios brasileiros, o tupinambá pode ser visto com o lindo manto de penas, feito com fibras naturais, penas vermelhas de guarás e azuis de ararunas

Dados linguísticos, resultantes de análises léxico-estatísticas, são unânimes em apontar o sudoeste da Amazônia, na bacia do alto rio Madeira, como o centro de dispersão dos povos Tupi.

Os poucos dados arqueológicos existentes para essa região  parecem corroborar esta hipótese. Entretanto, não há documentação que ateste a presença de grupos Tupi-Guarani na bacia do alto Madeira para mais de alguns séculos. Os únicos Tupi-Guarani do sudoeste amazônico, os Kagwahiva de Rondônia e os Guarani das terras baixas bolivianas, migraram durante o período colonial para essa região, respectivamente da bacia do Tapajós da região do Chaco.

A GRANDE EXPANSÃO TUPI

O antropólogo brasileiro Roger Bastide deu o nome de “A Grande Expansão Tupi” para descrever o processo histórico de deslocamento de grupos de povos Tupi, ocupando praticamente todo o território brasileiro entre os séculos XIII e XVI, formando diferentes culturas ao longo deste caminho.

Bastide nasceu em 1º de abril de 1898 em Nîmes e faleceu em 10 de abril de 1974, aos 76 anos, em Masison Laffitte. Ele realizou um estudo detalhado das culturas indígenas e afro-brasileiras que, junto com outros pesquisadores, desde meados do século XIX, buscaram compreender os processos e mecanismos que permitiram que os grupos de língua tupi-guarani ocupassem vastas áreas de as terras baixas da América do Sul.

Tal pesquisa foi iniciada por von Martius, mas foi von den Steinen quem observou semelhanças linguísticas e culturais que possibilitaram a unificação dos diferentes grupos Tupinambá e Guarani (Noelli 1996, 1998, 2008).

Foi também von den Steinen o primeiro estudioso a apontar o sudeste amazônico - no caso, o alto Xingu - como o centro de dispersão dos povos Tupi-Guarani “Será, portanto, de importância decisiva para o problema da emigração tupi saber se nas cabeceiras do Xingu, no Planalto Central, onde mais ou menos se encontra o ponto geográfico central da irradiação tupi, ainda existam tribos tupi. Admitindo que ali ainda elas existam, será necessário saber quais dialetos tupi se aproximam principalmente dessas tribos incólumes de qualquer civilização até hoje, através de sua linguagem, se colocam numa categoria próxima dos primeiros tupinambás, encontrados antigamente pelos descobridores”.

Uma das sínteses clássicas dos dados históricos desses grupos cultural e linguisticamente relacionados foi a produzida por Alfred Métraux para o Handbook of South American Indians vol. III de 1948. A designação Tupinambá, utilizada por Métraux, cobria todos os índios falantes de línguas da família Tupi-Guarani, desde a boca do Amazonas até Cananeia, nas proximidades do Trópico de Capricórnio, assim como alguns grupos que habitavam áreas próximas ao litoral.

Um dos primeiros comentários de Métraux foi que, por mais próxima que fosse a relação entre esses grupos, havia paradoxalmente uma ligação de animosidade entre um grupo e outro. Animosidade que era colocada em prática durante os intermináveis conflitos entre os grupos que, por sua vez, terminavam em um clímax ritualístico: os derrotados sendo servidos como prato principal. A economia desses grupos era baseada na agricultura, e que a mandioca era a principal planta cultivada. Além da agricultura, eles viviam da coleta, da caça e da pesca. As aldeias eram, segundo o autor, localizadas em topos de morro, com quatro a oito casas dispostas em torno de uma praça central, cada uma comportando até 200 pessoas. Algumas aldeias possuíam valas e paliçadas para defesa. As casas comunais eram ocupadas por pessoas relacionadas por sangue ou casamento. Cada casa comunal tinha um chefe. Acima de todos, estava o chefe da aldeia (Métraux 1948).

Dentro de cada dos Tupis-Antigos eram encontradas redes para dormir, bancos de madeira, cestaria e cerâmica. Outros objetos eram os ornamentos de pena, o estojo peniano, contas, colares, arcos e flechas e os barcos. Em muitos casos, a relação dos Tupinambá com as canoas que produziam foi central para a interpretação das dinâmicas desses grupos. Na visão de Métraux, as canoas serviriam para pescar, para atacar inimigos e, por que não, para se deslocar (e expandir) rapidamente.

Sítios arqueológicos localizados na Amazônia

Os trinta e sete sítios arqueológicos localizados no baixo Tocantins foram agrupados em três fases cerâmicas: Tauarí, Tucuruí e Tauá:

- A fase Tauarí foi definida a partir de seis sítios arqueológicos, localizados da foz do rio Itacaiúnas até próximo do trecho encachoeirado do rio. A cerâmica apresenta pequeno percentual de decoração, 87%, tendo como características gerais o predomínio de tempero mineral, seguido pelo cariapé e/ou cariapé e carvão;

- A fase Tucuruí é caracterizada a partir de vinte e um sítios arqueológicos, localizados entre a corredeira de Itaboca e a cidade de Tucuruí. A coleção cerâmica é composta de 88,45% de fragmentos sem decoração. O tempero é predominantemente mineral, com ocorrência de cariapé. As técnicas plásticas de decoração incluem o inciso, o modelado (geométricos ou biomorfos), raspado, ponteado, escovado, entalhado, roletado, corrugado, acanalado, ungulado e serrungulado;

- A última fase é a Tauá, caracterizada a partir de cinco sítios arqueológicos localizados entre a cidade de Tucuruí e a vila de Nazaré dos Patos. A cerâmica tem como características gerais o predomínio de tempero mineral, seguido por cariapé. A decoração plástica compreende nas técnicas de inciso, modelado, corrugado, ponteado, escovado, entalhado, acanalado, roletado, digitado e raspado. As técnicas de pintura são como as da fase Tucuruí.
Araújo Costa e Simões (ops. cit.) associam as três fases à tradição Tupiguarani. Também definem essas ocorrências do sudeste do Pará como tradição Itacaiúnas:
“Estas três fase e outras da mesopotâmia Xingu-Tocantins, como Carapanã, Itacaiúnas, Pau d’Arco, Pacajá, Marabá e as ainda não nominadas da área do Projeto Carajás, formam uma tradição regional distinta, a qual se resolveu denominar tradição Itacaiúnas. A fase Tauarí é a que mais se identifica com a fase-tipo Itacaiúnas enquanto Tucuruí e Tauá apresentam maiores afinidades com a fase Carapanã,” (Simões e Araújo Costa, 1983, p 15).

Achados Recentes

Restos mortais de Indigenas Tupi foram encontrados dentro de artefato de cerâmica com desenhos tradicionais em rituais de sepultamento da etnia -  Foto: Bruno Concha/Secom - reprodução CNN

No começo de 2022, uma equipe de arqueologia na Bahia fez uma descoberta extraordinária: encontraram uma urna cerâmica pré-colonial que pode ser a sepultura de um indivíduo tupi-guarani. 

Segundo arqueólogos que trabalham na obra da Avenida Sete de Setembro, desenhos no interior do vasilhame de cerâmica comprovam sua data e origem Tupi

O artefato foi desenterrado durante escavações na avenida Sete de Setembro, em Salvador, próximo ao relógio de São Pedro. No interior do vasilhame, havia um corpo sepultado, sugerindo que possivelmente se tratava de um homem indígena que viveu entre os séculos XIV e XVI na região. Essa importante descoberta, juntamente com mais de 12 mil outros artefatos históricos encontrados no local, será estudada no Centro de Antropologia e Arqueologia de Paulo Afonso, em Salvador, contribuindo para a compreensão da história e presença dos indígenas nessa área.

Como eles se movimentavam pelo Brasil

Existem modelos propostos por estudiosos que oferecem diferentes interpretações sobre como os povos indígenas se moveram e se expandiram na América do Sul, considerando fatores como geografia, linguagem e cultura. Cada modelo aborda aspectos únicos do processo de expansão e migração:

1 - O Modelo Hidrográfico:
Proposto por Erland Nordenskiöld, enfatiza as bacias hidrográficas da América do Sul como importantes rotas de expansão, rodovias de alta velocidade para movimentações de grupos indígenas, permitindo grandes movimentos populacionais;

2 - O Modelo Linguistico de Schmitz:
Pedro Inácio Schmitz baseia seu modelo na origem amazônica dos Tupi, seguindo um modelo linguístico, sugerindo que esses grupos se originaram na Amazônia e se expandiram para outras regiões, devido à facilidades de comunicação;

3 - Modelo “Cardíaco” de Lathrap:
Donald Lathrap propõe uma semelhança com o sistema circulatório de uma região central, o coração (região do Xingu), que grupos Tupi, como os Tupinambá e os Guarani, expandiram como o sangue no corpo humano, a partir deste núcleo por meio de rotas fluviais, como as artérias e vasos sanguíneos, como vias de expansão;

4- Modelo de Brochado:
Proposto por José Joaquim Justiniano Proenza Brochado, associa grupos Tupi a diferentes áreas geográficas com base em evidências culturais, linguísticas e arqueológicas, através de um grafo denominado “grande jacaré amazônico”, em que a parte superior da mandíbula daria origem ao movimento Guarani, e a mandíbula daria origem ao movimento Tupi;

A seguir veremos cada um deles detalhadamente:

Modelo Hidrografico

Essa visão era coerente com o panorama proposto por Nordenskiöld (1930), que via nas três grandes bacias hidrográficas na América do Sul:

Bacia dos principais rios da América do Sul

-Bacia Amazónica – Brasil, Bolívia, Perú, Colombia, Equador, Venezuela e Guiana
-Bacia do Orinoco – Venezuela e colombia
-Bacia do Paraná – Brasil, Paraguai, Argentina, Uruguai e Bolívia

Uma rede de conexões que teria permitido grandes movimentos populacionais pelo continente. Panorama que seria adaptado por Lowie e Steward para o Handbook of South American Indians, sintetizando o conceito de Floresta Tropical.

Modelo de Brochado

O Modelo de Brochado, proposto por Jose Joaquim Justiniano Proenza Brochado ( grduado em história pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul 1963, especialização em Arqueologia pelo Museo y Facultad de Ciencias Naturales Universidad Nacional de La Plata, 1973) e doutorado em Antropologia pela University of Illinois(1981)., é uma abordagem que tenta explicar a expansão e migração dos povos Tupi na América do Sul com base em dados etnográficos, linguísticos e arqueológicos. Ele descreve duas subtradições Tupi e as associa com duas levas de migração Tupi, representadas graficamente pelo "grande jacaré amazônico". Este modelo é considerado uma das obras mais completas sobre a arqueologia Tupi.

Entretanto, existem críticas a esse modelo, particularmente em relação à associação da Tradição Policroma Amazônica com os falantes de línguas do tronco Tupi, que carece de evidências etnográficas ou históricas sólidas.

É importante reparar que o Modelo Hidrográfico, mencionado no texto, enfatiza a importância das bacias hidrográficas na América do Sul, especialmente as bacias do Amazonas, Orinoco e Paraná, como redes de conexões que permitiram grandes movimentos populacionais pelo continente. Isso sugere que os rios desempenharam um papel crucial na mobilidade e na ocupação de territórios por grupos indígenas.

Ambos os modelos representam abordagens teóricas para entender a migração e expansão dos povos indígenas na América do Sul, e cada um enfatiza fatores diferentes que influenciaram esses movimentos ao longo da história pré-colonial.

Modelo do Grande Caiman (cayman, pinça ou jacaré) proposto por Brochado no qual o maxilar é a origem Guarani e a parte superior da mandíbula é Tupi

Quanto às criticas, tanto de etnólogos quanto de lingüistas, a respeito deste modelo de Brochado, a principal delas refere-se à associação da Tradição Policroma Amazônica com os falantes de línguas do tronco Tupi. 

Não existe nenhuma evidência, etnográfica ou histórica que permita esta associação (HECKENBERGER ET AL, 1998, URBAN, 1996). Apesar dos apontamentos de Lima (2005) sobre a relação dos campos decorativos entre as cerâmicas Marajoara/Guarita e Tupiguarani, Schaan (2007) após enumerar diferenças entre ambas afirma:

“(...) Poderímos ir adiante enumerando diferenças. Percebe-se claramente diferenças marcantes entre estas duas populações, o que nos leva a considerar as poucas semelhanças encontradas na cerâmica como pouco significativas” (Schaan, 2007, p 12)

O Modelo de Shmitz

Na década de 1990, diversos modelos são retomados, mas sem grandes modificações. Pedro Inácio Schmitz de 1991 (mapa 3) reitera sua posição adotada em 1985, baseado no modelo lingüístico de Migliazza para a origem amazônica dos Tupi.

O "Modelo Cardíaco" de Lathrap
O modelo de dispersão mais aceito, com origem no alto Xingu, usando das trilhas ancestrais para se espalharem pelo Brasil, posto que não usavam da navegação para este fim 

Donald Lathrap da universidade da California propós em 1970, em seu tratado não publicado, um modelo de expansao que, tal como um sistema circulatorio, tinha um epicentro de circulação, às margens do rio Madeira em gerião Xinguana. 

Ele oferecia uma proposta para a compreensão da história de longa duração dos grupos indígenas nas terras baixas da América do Sul, com destaque para os Tupinambá e para os Guarani. 

Nesse modelo, tais antigas populações do tronco Tupi teriam se expandido a partir da Amazônia central. Nesta região, assim como por quase toda a calha do rio Amazonas e por alguns dos seus principais afluentes, esses antigos grupos Tupi produziriam vestígios materiais ligados à Tradição Polícroma Amazônica (TPA). 

Nesta perspectiva, e do ponto de vista arqueológico, as Subtradições Tupinambá e Guarani seriam identificadas ao longo do litoral atlântico, nas áreas de mata atlântica, nos vales do sul do Brasil e no entorno deste, e em algumas outras regiões (Noelli 1996, 1998, 2008). Tais agrupamentos possuiriam uma cultura material semelhante, o que permite falar em uma Tradição Tupi-Guarani.2 Além disso, nesta visão, o eixo desse processo teria seguido vias fluviais ou costeiras.

Quem eram os Tupinambás

Graças aos livros de Lerry Thevet e Hans Stadens, sabemos como era a sociedade dos Tupis (Tupinambás, Tupiniquins, etc. ). Esses relatos começam com a aventura de Hans Staden, no ano 1553, que ao realizar uma caçada sozinho em Bertioga, foi capturado por indígenas que o trataram com muita violência - Staden logo percebeu que a intenção dos indígenas era a de devorá-lo em um sofisticado banquete, servido com o mais fino Cauim.

Apos passar por vários momentos de terror, Staden sobreviveu ao contato com os canibais, voltou a Europa, quando escreveu sobre essas verdadeiras desventuras quase inacreditáveis no ano de 1556, fazendo do Brasil e seu provo um dos lugares mais incríveis e assustadores do mundo de sua época.
Artefatos dos Tupinambá, a muçurana, a corda que o prisioneiro carregava dentro da aldeia enrolada na cintura - o numero de nós representava o numero de luas até a data de seu sacrificio, o enduape, ornamento com penas gigantes, provavelmente de emas, que era usado nas costas e a ibirapema, budurna, especie de maça utilizada para dar o golpe ritual na nuca do refém.

A veracidade dos relatos de Staden são autenticados no ano seguinte no livro do francês André Thevet, de religião católica e posteriormente pelo calvinista Jean de Léry. Thevet teve sua experiência obtida ao fazer parte do grupo denominado França Antártica no Brasil, que após passar dez semanas vivendo na Baía da Guanabara, regressou à França por estar doente. No ano seguinte, publicou a obra intitulada ‘As singularidades da França Antártica (1557)’: uma fonte relevante por ser uma das primeiras obras a fazer menção ao Brasil em pleno descobrimento, no entanto, escrito com ênfase no fantástico ao transparecer a presença do imaginário medieval.

Já Jean de Léry que veio para o Brasil em 1558, juntamente com um grupo de quatorze pastores calvinistas, e cinco donzelas para habitar a França Antártica fez um realto bem mais acurado. No decorrer de sua estadia os conflitos ideológicos entre católicos e protestantes, fez que ele tivesse uma visão muito mais critica ao trabalho de Thevet, que após dezenove anos do seu retorno, publicou seu diário denominado ‘Viagem à terra do Brasil (1577)’, uma obra muito mais elaborada que tinha o declarado intuito de desmentir equívocos e mentiras contidas no livro de Thevet.

Essas três importantes obras ilustradas que renasceram na decada de 1920 Totem e tabu, de Freud, o manifesto Cannibale, de Francis Picábia, lançado em 1920, e o livro L’Anthropophagie rituelle des Tupinambás, de Alfred Métraux, que inspiraram os modernistas de 1922, Tarsila, Oswald e Mario de Andrade, fizeram que nós conhecêssemos a cultura, idioma e hábitos dos povos Tupis com rigor científico em estado de arte.

Banquetes que demandavam por refinada etiqueta, como as européias e éticas de guerra, com rituais semelhantes aos dos Samurais japoneses

O Brasil daquela época era ocupado por tribos irmãs e beligerantes, a guerra era uma atividade constante, Potiguares eram inimigos de Tabajaras, que por sua vez eram inimigos de Caetés, rivais dos Tupinambás, os quais, guerreavam constantemente contra os Tupiniquins. Essas guerras eram regidas por códigos atentamente observados e seguidos a risca por todos esses ‘primos’, falantes de variações do mesmo idioma, o Tupi Antigo.

O ato da guerra era sagrado e tinha como o momento culminante do embate, o apogeu ritualístico definitivo e verdadeira consagração da vitoria, a Antropofagia. Os ARAPURUS (comedores de gente) tinham rituais muito bem coreografados e a dinâmica do ritual canibalístico era muito elaborada, existem relatos de outros atos canibilísticos ao redor do mundo, mas foi aqui, nos litorais brasileiros que essa pratica teve a sua aplicação mais requintada.

1 – A guerra

Enquanto os portugueses estavam preocupados com a exploração dos recursos da nova colônia, os povos indígenas estavam totalmente dedicados aos atos de guerra intertribais. No ano de 1565 os portugueses resolveram tomar uma posição mais forte e uma batalha foi travada entre portugueses, aliados ao Tupiniquins contra os franceses, aliados dos Tupinambás. Poucos anos mais tarde a maior parte dos franceses foi expulsa da região da Gauanbara, que tinha Villegagnon, um cavaleiro católico de Malta como líder, junto aos Tupinambás da resistência. Essa derrota só foi possível com a ajuda dos Tamoios, sob a liderança de Aimberê, dando origem assim ao Rio de Janeiro.

O executor perguntava: -“Ere-îuká-pe oré anama, oré iru abé?” (mataste nossos companheiros e nossos parentes, o prisioneiro então relatava seus feitos heróicos: - “Pá, Xe r-atã, a-iuká, opabe a-‘u. Xe anama xe r-eõ-nama resé xe r-epyk-y-ne. Xe anama e’i-katu pe îukabo” (Sim, eu sou forte, matei-os e comi-os todos, minha família, por minha morte vingar-me-á, minha família irá matar vos).Prisioneiro dos Tupinambas amarrado pela cintura com a MUÇURANA em ritual de sacrifício, O executor, vestindo um lindo manto de GUARÁ, empunha a IBIRAPEMA
Em meio a essa guerra toda, guerreiros de tribos inimigas eram capturados e ai então os Abá-Porus faziam a festa

2-O Prisioneiro de Guerra

No exato momento em que o inimigo era capturado, o guerreiro responsável pela captura virava seu dono, e passava a ter responsabilidade direta sobre seu cativo até o final de todo o processo, que culminaria com com sua canibalização. Os prisioneiros eram amarrados pelos pés e mãos, o que impossibilitava sua caminhada, para se locomoverem, eles tinham que dar ‘pulinhos’, situação que se ridicularizava bastante o capturado.

Aos pulos os prisioneiros eram conduzidos até a aldeia dos vencedores, ao passar pela entrada principal, eram recebidos com animosidade e ainda mais humilhação, os residentes jogavam restos de comida e pedriscos e se dava o seguinte dialogo:

O captor dava a ordem ao prisioneiro: -“Enhe'eng tembi'u” (Fale, comida); O prisioneiro então respondia: “Aîur-ne pe rembi'urama” (Estou chegando eu, sua comida);
As pessoas da tribo, jogando pedriscos e restos de comida no prisioneiro completavam: “Opererek îandé rembi'u oîkóbo” (Aí vem chegando nossa comida).

Nos próximos dias, o prisioneiro recebia o tratamento equivalente ao de um primo distante, era hospedado na oca do captor, era bem alimentado, a zombaria cessava 'em parte' e o anfitrião oferecia, alimento, rede e até mesmo sua filha ou sua esposa para que este se satisfizesse sexualmente. Nos primeiros dias, ele recebia também uma longa corda com nós para ser usada ao redor do corpo e pescoço, chamada de MUÇURANA. A Muçurana tinha uma quantidade de nós que representava o numero de ciclos lunares até sua execução. O prisioneiro jamais tentava fugir, pois isso seria a maior vergonha para ele e sua tribo. Na bizarra hipótese da fuga do prisioneiro, as pessoas de sua própria tribo não o aceitariam de volta e o conduziam vergonhosamente a aldeia dos captores para seu destino que já estava determinado pelo condigo de conduta da tradição oral mais antigo que se conhecia.

Os Tupis, tal qual os samurais prezavam a morte digna, o tumulo mais honroso para um guerreiro era o estomago de seu inimigo - Ter suas entranhas devoradas por vermes e insetos era repugnante e desprezível.

3- O Banquete

No dia anterior ao banquete, todos bebiam o Cauim, bebida fermentada de mandioca produzida exclusivamente pelas mulheres pelo processo de mastigação e cusparada (a amilase salivar transformava amido em açúcar, que por sua vez era fermentado por leveduras exógenas, criando assim uma bebida de graduação alcoólica não superior a 8,5%), e tinha inicio uma grande festa.
Capa de penas de guará e de papagaio, pertencia à tribo de índios Tupinambá. Após a chegada do europeu em 1500, grande parte destas preciosidades foram saqueadas. O destacado Manto Tupinambá, que já foi confundido com o manto de um imperador azteca e foi levado daqui pelo governador holandês de Pernambuco, no século 17. Hoje pertence ao Museu Nacional de Arte da Dinamarca.
Na manhã seguinte, o prisioneiro tomava um banho e depois era ornado com penas, casacas de ovos, e outros adereços, eram também feitas pinturas vermelhas de urucum e pretas de jenipapo. Uma pantomima sempre acontecia nesses rituais - permitia-se que o prisioneiro fugisse até a entrada da aldeia quando era recapturado, numa encenação ritualística, e voltava amarrado com a Muçurana pela cintura, trazido por dois guerreiros, um de cada lado da corda e trazido para frente do executor enquanto a tribo toda gritava e se alvoroçava, aumentando assim o clima da festividade ao seu êxtase.

O Executor que também havia se banhado e submetido a uma pajelança com ervas e unguentos, após a longa cauinagem da madrugada, trajava-se de forma ritualística, com plumas pinturas e um maravilhoso MANTO GUARÁ vermelho feito com pele de lobo-guará, ornado com plumas de arara e tucano. Um dos momentos mais acalorados da festa era quando o executor se colocava na frente do prisioneiro, o absoluto silencio se fazia e acontecia outro dialogo:

O executor perguntava: -“Ere-îuká-pe oré anama, oré iru abé?” (mataste nossos companheiros e nossos parentes?)
O prisioneiro então relatava seus feitos heróicos: - “Pá, Xe r-atã, a-iuká, opabe a-‘u. Xe anama xe r-eõ-nama resé xe r-epyk-y-ne. Xe anama e’i-katu pe îukabo” (Sim, eu sou forte, matei-os e comi-os todos, minha família, por minha morte vingar-me-á, minha família irá matar vos).

Após o dialogo, o executor empunhava uma pesada arma, assemelhada a uma enorme maça, com um peso na ponta, ornada com plumas, que previamente fora preparada com orações e libações, chamada ‘IBIRAPEMA’, a manejava com destreza em movimentos marciais coreografados, encaminhava-se para traz do prisioneiro e acertava a base do crânio com muita força.

A morte era rápida, o crânio era despedaçado em sua base.

As mulheres mais velhas rapidamente colocavam um embolo em seu anus para evitar que os fluidos saíssem, recolhiam seus miolos e demais fragmentos espalhados pelo chão e tentavam recolher a maior parte possível de sangue. O corpo permanecia de pé, amparado pelas Muçuranas, fazendo com que seu sangue não fosse espalhado pelo chão, havia uma propósito muito nobre para todo esse sangue.

O sangue colocado em vasos de barro cozido e era bebido ainda quente por todos, as mulheres passavam em seus seios e davam o peito aos bebês, seu corpo era colocado com muito respeito dentro de um caldeirão já com água fervente, para facilitar a retirada da pele, ai então o corpo era desmembrado, cortado pelo dorso e levado para a defumação (moqueágem). Após alguns minutos o corpo era virado, abria-se o ventre e os miúdos eram misturados a farinha e o mingau era dado para as crianças, só os grandes guerreiros podiam comer um mingau preparado com a pele ao redor do crânio, e os órgãos sexuais eram devorados pelas mulheres. A língua e os miolos eram comidos por pré-adolescentes de 12 a 16 anos de idade.

Logo apos a execução, o executor era arranhado pelo líder tribal com dente de onça, de forma que a escarificação já cicatrizada servia-lhe como honraria – Quanto mais escarificado, melhor guerreiro era. Todo esse ritual era acompanhado de musica de flauta feita com os ossos dos prisioneiros abatidos anteriormente.

Ao final de 4 horas, o ritual acabava e os habitantes da tribo se recolhiam aos aposentos para dormir, a final de contas, ficaram acordados a noite toda para o grande evento.

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